O movimento iluminista do século XVIII pretende
libertar as pessoas da tradição e da autoridade, para submeter todo o
conhecimento ao império da razão. Por isso, prega uma crítica ao conhecido.
Criticar é fazer triagem: krinein, em grego, significa “selecionar,
discernir”. Enquanto Aristóteles invocava a autoridade dos anciãos, por causa
da idade avançada, Descartes apelava para a negação de todo o conhecimento
adquirido para, do zero, construir o seu próprio saber.
A luneta de Galileu, que lhe permitiu o questionamento
da autoridade, é um exemplo do uso da razão e da demonstração. Como os homens
resistem às descobertas que põe em dúvida aquilo que sempre acreditaram, e
procuram a qualquer preço integrá-la em sua teoria antiga, Galileu teve de
fazer esforços hercúleos para defender a sua teoria heliocêntrica, pois foi o
primeiro a contestar as afirmações da Aristóteles sobre a Física.
Descartes e Galileu pensam que não se encontrará a explicação da
natureza através de uma leitura assídua dos autores. Quanto mais assídua, mais
fácil será passar ao largo da verdade. O acúmulo dos conhecimentos livrescos
não substitui o exercício da razão. O verdadeiro filósofo não pode se tornar
“doutor em memória”. Ele precisa exercitar a sua razão, como na frase celebre
de Kant: “Sapere Aude! Tenha coragem de construir o seu próprio conhecimento.
Descartes chama a nossa atenção para os discursos que louvam o
enigma, pois podem encobrir a verdade dos fatos. Esses conhecimentos podem
ofuscar a luz natural. Por luz natural, Descartes entende a razão, a capacidade
de distinguir o falso do verdadeiro. Daí que devemos submeter toda a autoridade
ao exame e à autoridade da razão. Podemos nos valer do que os outros
pesquisaram, mas tudo isso deve fazer parte de nosso estoque de conhecimento,
que foi ruminado pela nossa razão.
Fazer dos outros filósofos um princípio de autoridade, leva-nos a
abdicar de nossa razão, pois como seres pensantes, não podemos nos fiar
cegamente em tudo o que os outros disseram.
Fonte de Consulta
RAFFIN, Françoise. Pequena Introdução à Filosofia.
Tradução de Constância Morel e Ana Flaksman. Rio de Janeiro: FGV, 2009.
(Coleção FGV de bolso. Série Filosofia)
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