César Chesneau du Marsais, no seu texto
sobre o Verdadeiro Filósofo (1796), traça
um paralelo entre os que se dizem e os que são realmente filósofos. Muitos se
dizem filósofos mais para enganar os outros - e consequentemente a si mesmos -
do que para bem educar o seu pensamento. No primeiro caso, ele age segundo um
dogma, uma superstição, uma emoção, um interesse; no segundo, em função de uma
reflexão, de uma meditação e de uma tomada de decisão, baseada na lógica e na
razão.
O verdadeiro filósofo não se espanta
com o que os outros dizem. Observe que há muitos pensadores que falam em evitar
as impressões dos sentidos para não se envolverem com as emoções que daí
dimanam. O verdadeiro filósofo procura sentir, raciocinar e enfrentar toda e
qualquer situação, para dela extrair o suco saboroso do conhecimento,
conhecimento este que foi buscado, trabalhado e meditado sob a luz da razão. É
aumentando a potência dos órgãos que aumentaremos o conteúdo doutrinal dos
conhecimentos.
Neste texto, César Chesneau du Marsais
faz uma crítica à demanda religiosa. Os religiosos da Idade Média raciocinavam
segundo os cânones da Escolástica. Nela, havia os mais calorosos debates sobre
as questões dos universais, da natureza de Cristo, da Trindade Universal etc. O
autor destaca que essas discussões em nada auxiliavam a prática religiosa e a
mudança comportamental dos seus adeptos. Daí, ele afirmar que meditar demais é
tão prejudicial quanto meditar de menos. Para ele, "O devoto só é honesto
por paixão, e as paixões nada têm de seguro".
O verdadeiro sábio age de acordo com
aquilo que Veleius — militar e historiador romano — disse sobre Catão de Útica,
político romano: Nunquam recte fecit, ut facere
videretur, sed quia aliter facere non poterat (Ele
jamais praticou uma boa ação para parecer que a praticou, mas porque não estava
nele fazer de outro modo). Quer dizer, o filósofo verdadeiro não precisa de
guarda, de fiscal, pois quando sentir que a sua consciência está tisnada,
mudará imediatamente de comportamento, porque teme ficar em desacordo consigo
mesmo.
O supersticioso crê que o Ser Supremo o
colocou acima dos outros homens. É para este Ser que ele transfere todas as
suas ações. O verdadeiro filósofo tem uma ideia melhor do que seja o bem
público, porque as suas ações se voltam para o relacionamento com os outros
homens, no sentido de servi-los. O sábio insensível dos estoicos está distante
da perfeição do nosso filósofo. Este não deixa que o maravilhoso corrompa o
racional. Além de se cuidar por fora, examina-se ainda mais cuidadosamente por
dentro de si mesmo.
Em síntese, o verdadeiro filósofo
escolhe para si uma religião pura, simples, clara e livre de quaisquer
preconceitos.
Fonte de Consulta
DU MARSAIS, César Chesneau. O Verdadeiro Filósofo (1796). In: DU MARSAIS, César Chesneau. Filosofia Clandestina: Cinco Tratados Franceses do Século XVIII.
Seleção, apresentação e tradução de Regina Schöpke e Mauro Baladi. São Paulo:
Martins, 2008. (Coleção Tópicos Martins)
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A filosofia, desde tempos remotos, visa desenvolver no iniciado o amor à
sabedoria. A sabedoria, por sua vez, é um termo que
significa erudição, saber, ciência, prudência, moderação, temperança, sensatez,
enfim um grande conhecimento. Desta forma, a sabedoria não cai do céu. Há
que se fazer esforço, dedicação e muita perseverança. E este deveria ser o
trabalho de todo o indivíduo preocupado com o seu crescimento moral e
intelectual.
Recordemos a filosofia dos gregos antigos. O objetivo era descobrir a
verdade que se ocultava na aparência das coisas. Cada qual tinha o seu método
de procura. Comparemos Platão e Aristóteles. Platão
– idealista – acreditava que as ideias provinham de um outro mundo, o mundo das
essências, denominado topus uranus. Aristóteles – realista –
acreditava que as ideias provinham das sensações ou do mundo circundante do
aqui e do agora. Aristóteles achava que o ser humano não devia ficar preocupado
com a contemplação do mundo das ideias, mas viver intensamente o momento
presente.
Com o tempo, os filósofos foram desenvolvendo os seus sistemas que,
depois, eram aproveitados pelos seus seguidores. Nesse caso, o livre pensar
acabava ficando em segundo plano. O pensamento de Kant ou de Descartes é
veiculado formando uma base de conhecimento universitário. Por isso, diz que
Scruton foi um filósofo de verdade e não um cidadão que se formou em filosofia.
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